terça-feira, 27 de março de 2007

Os Males


No século XIX encontrar-se uma Europa dominando o mundo. A Revolução Industrial, a mudança no modo de produção, o crescimento da produção em escala e as mudanças nos sistemas de comunicação - a chegada dos navios a vapor, as estradas de ferro e o telégrafo - levaram a uma expansão do comércio europeu, que foi acompanhada de um fortalecimento do poder armado na maior parte dos estados europeus. A primeira conquista de um país árabe foi a da Argélia, pela França. Os países europeus eram os ricos, eles detinham a tecnologia da época. Os povos dominados, até tentaram, mas não conseguiram em um primeiro momento, sair da dominação européia. Com os europeus no poder do tráfico negreiro fez com que, a partir dos séculos XVIII e XIX, em que houve expressiva representatividade de pessoas oriundas do Sudão Central, chegassem ao Brasil novos mulçumanos. A foto acima, mostra a desumanidade com os negros já nos navios. No lucro, até a igreja tinha uma porcentagem dos escravos que entrasse (taxa). Os negros mulçumanos sudaneses são assim descritos pelo autor Arthur Ramos em sua obra "Introdução à Antropologia Brasileira":

"Eram altos, robustos, fortes e trabalhadores. Usavam como os outros negros mulçumanos, um pequeno cavanhaque, de vida regular e austera, não se misturavam com os outros escravos."

Eram denominados "malês", que significa professores, educadores em árabe. Organizaram a recuperação da religião islâmica entre os escravos, a partir dos registros em memória do Sagrado Alcorão e das tradições do Profeta Muhammad (saws). Promoveram, ainda que de forma secreta, atividades de alfabetização e memorização do texto sagrado. Mesmo enfrentando oposição e perseguição do proprietários de escravos, escreviam panfletos, se comunicavam em árabe, e se organizavam constituindo conselheiros e juízes em suas comunidades.

Alguns conseguiram a alforria, por aprender um ofício, como por exemplo a carpintaria, ou por outro motivo. Entre os que conseguiram a liberdade alguns viajaram à África, buscando restabelecer o contato com os centros islâmicos em seus países de origem. Existem registros e indícios que sustentam a tese de que a alguma comunicação foi em parte estabelecida. Como exemplo pode-se citar, tendo como referência pesquisa de Paul E. Lovejoy: "Abd- al Rahman al-Baghdadi al-Dimashqi foi para o Rio de Janeiro em 1865 e travou conhecimento com mulçumanos clandestinos vivendo lá, ficou dois anos para instruir mulçumanos locais nos rituais e normas do Islam."

Os malês foram os grandes idealistas das revoltas e dos movimentos de libertação. Instruídos, com capacidade de organização, e motivados pelos ideais islâmicos de liberdade e resistência à tirania, mobilizaram seus pares em diversas revoltas. O início do século XIX foi marcado por uma seqüência de revoltas denunciando o clima de tensão crescente e o inconformismo com a situação de escravidão. As principais ocorreram nos seguintes meses e anos: maio de 1807; 4 de janeiro de 1809; fevereiro de 1810; fevereiro de 1814; janeiro e fevereiro de 1816,; junho e julho de 1822; agosto e dezembro de 1826, abril de 1827; março de 1828; abril de 1830. Em 25 de janeiro de 1835 estoura uma revolta de grandes proporções que passou a ser conhecida na história como "Guerra dos Malês". Os revoltosos percorreram as ruas da capital da Bahia, atacaram o palácio do Presidente da província, invadiram quartéis, enfrentaram tropas e fragatas de guerra ancoradas no porto. Foram totalmente subjugados pelas forças do governo.

A partir da revolta dos malês a religião islâmica passou a sofrer uma severa repressão. Foi taxada como religião selvagem que incitava a revolta nos negros escravos, então considerados seres sem alma humana. Para a mentalidade da época, não havia que se pensar, para seres sem alma, em direito à liberdade, à justiça, à vida, à religião ou à dignidade. Depois disso, mulçumanos foram julgados e muitos condenados à morte. Outros foram deportados para a África, para reduzir a influência deles. Os que escaparam, passaram a viver clandestinamente. Com tudo isso, podemos notar que a religião foi a motivadora e a grande ajuda que eles tiveram.

Nenhum comentário: